Sandra Loffreda
Fazendo da tristeza dos amigos a minha tristeza e, assim dividida, vai dando espaço pra alegria :D

Lindo texto do amigo Will que tomei a liberdade de me apropriar e ilustrar com minha aquarela.
Tristezas
Ai, a tristeza...

Esse aprendizado dolorido que nos faz valorizar os finais, que são sempre os momentos mais importantes dos livros, filmes e da vida.

No vale da tristeza a paisagem não é exuberante: um vira-latas espera iscas do espetinho de gato que lhe será servido no calor da calçada, recompensa do seu dono entre uma dose e outra de álcool, pois só os cães são capazes de compartilhar a dor humana sem traçar opiniões ou julgamentos.

O livro da tristeza não é escrito somente com lágrimas, mas com ironia. Esse recurso que permite falar uma coisa e dizer outra, separa nós de nós mesmos, nos por em dois lugares ao mesmo tempo. O ser ou não ser hamletiano, a irônica tristeza da dúvida esculpida por Machado de Assis em Dom Casmurro.

Tristeza é miragem de alguém que já se foi, ela nasce no coração, percorre os rios das lembranças e se desfaz no oceano dos olhos.

Olhando essa garrafa de bebida assim, companheira da minha tristeza, é que me dou conta do seu formato feminino, sua cintura, sua abertura vaginal apontando para os céus, me oferecendo seu néctar que arde-me a boca mas adoça-me o viver.

Tristeza é um parêntese da vida, uma pausa...

Em meus rompantes de tristeza, escrevo para não falar. É quando Álvaro de Campos me dá seu ombro amigo e sussurra na minha memória trecho, cuja fonte exata agora me foge, noutras palavras ele diz que poesia é uma construção de palavras em cujas frestas se ouve uma outra voz, uma melodia que faz chorar.

É quando me junto à criatividade reparadora de alguns pintores do entardecer. 


Lupicínio Rodrigues me convida a pensar: “A minha casa fica lá de traz do mundo, onde eu vou em um segundo quando começo a pensar, o pensamento parece uma coisa à toa, mas como é que a gente voa quando começa a pensar”. 


Nelson Cavaquinho me oferece sua mão para tocar a ferida: “Tire o seu sorriso do caminho que eu quero passar com a minha dor”. 


Cartola sopra o machucado: “Queixo-me às rosas, mas que bobagem, as rosas não falam, simplesmente as rosas exalam o perfume que roubam de ti”...

As tristezas da vida são como certos sambas, a letra fala de coisas tristes, mas a melodia é tão feliz quanto pardal pela manhã se saracoteando na terra quente do cerrado.

Palavras, inúteis para a tristeza. É no silêncio do coração que a tristeza canta mais alto um triste réquiem de despedida. Basta ver uma cerimônia fúnebre, onde as velas choram em silêncio a essência do que realmente são.

Melancolia é síncope, tão diferente de outros sentimentos que pedem abraço, beijo e brincadeiras dos corpos... É o amargo caminho que leva ao solitário encontro com nós mesmos. Ela corta a água, a luz e o telefone e nos coloca diante do labirinto da vida.

Tristeza e amor vivem se cruzando na espiral da vida. As mais belas estórias de amor se imortalizaram por uma pitada de tristeza nos desencontros: Romeu e Julieta, Tristão e Isolda, Abelardo e Eloisa, O paciente Inglês, As Pontes de Madison, O Amor Nos Tempos do Cólera, Love Story e tantas outras...

Ah, caro Platão, deixe-me dar um mergulho no rio do esquecimento, Letes, que fica no caminho das almas que retornam ao mundo para mais uma rodada de viver!

Manuel Bandeira, nobre amigo e fonte de inspiração, convida-me a passar férias em Pasárgada, já que: “Lá a existência é uma aventura / … / Tem um processo seguro de impedir a concepção / Tem alcalóide à vontade / Tem prostitutas bonitas para a gente namorar / E quando eu estiver mais triste / Mas triste de não ter jeito / … / Terei a mulher que eu quero / Na cama que eu escolherei...”.

Por fim, me consolo em acreditar que talvez ela seja apenas uma estação do caminho, que começa com o amor, termina com a tristeza, mas se eterniza com as lembranças...
 Triste - Aquarela - 2009
 
Bejoconas felizes
3 Responses
  1. Will Says:

    Ual!

    fascinado como conseguiu transformar meus limões em doces cores. Teu talento tem um quê de divino e sublime, que me pergunto se as cores saem do arco-íris ou do teu coração...

    Grato ad infinitum pelo carinho da publicação!


  2. Eva Says:

    Que lindo o teu post, amiga, tristeza é um momento de aprofundamento, de faxina, de sentimento que grita para que nossos eus se casem e encontrem a harmonia, tristeza é um alerta para retomarmos a meta maior que nos propusemos ao primeiro suspiro dessa vida, achei lindamente colocada aqui no teu post, magnífica tua arte, muito emocionante, cheia de sentimentos puros. bjinhos flor.


  3. Angela Says:

    Sandra li pela manhã esse texto no blog do Will, e vc conseguiu com tua sensibilidade me emocionar aqui com essa explosão de cores uma poesia triste,isso é arte!Bj e ótima semana.


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